Levantamento do MPT mostra que casos de humilhação no trabalho aumentaram 74% de 2012 para 2013 (Patrícia Basilio)
Dois antidepressivos por dia mais um remédio para dormir. São esses os medicamentos que a bancária Beatriz* de 42 anos tem de tomar todos os dias desde que descobriu ter fibromialgia e depressão.

A bancária foi diagnosticada com distúrbios psiquiátricas após crises de choro e dores constantes pelo corpo todo. Por este motivo está afastada do trabalho há cerca de seis meses.
“Descobri que estava doente porque quando chegava no banco começava a chorar. Também passei a dormir mal porque acordava de madrugada pensando que algo estava acontecendo no trabalho" recorda a bancária que é administradora de empresas.

O motivo que levou a profissional a ficar doente é cada vez mais comum no setor bancário brasileiro: assédio moral.
Segundo levantamento do Ministério Público do Trabalho (MPT) a pedido do iG das 3 mil denúncias realizadas em 2013 30% foram de bancos. De 2012 para 2013 o número de acusações aumentou 74%. O ritmo de expansão do assédio moral no Brasil é maior do que o apontado pelo MPT.

Em 2011 29% dos trabalhadores do setor bancário pediram o fim do assédio moral. Em 2012 o número aumentou para 31%. Em 2013 para 58% – de um total de 37 mil entrevistados. Ou seja o índice dobrou de 2011 para 2013. No caso do assédio sexual o desconforto é menor. Apenas 378% dos bancários ouvidos pela pesquisa (14 mil trabalhadores) reivindicam o combate ao assédio sexual.

Segundo estudos o assédio moral ocorre em grande parte por conta das metas agressivas determinadas pelas instituições bancárias.

A cobrança é cada vez mais ambiciosa. Se o trabalhador atingiu os objetivos em um mês no próximo é cobrado para superá-los. Não há limites que defende a participação de funcionários na elaboração das metas.

A pressão foi um dos motivos que levou Beatriz* a se sentir humilhada. "Era obrigada a fazer hora extra. Quando não podia trabalhar além do horário falavam que tinha pouco comprometimento e argumentavam que havia muitos profissionais que nem eu disponíveis no mercado de trabalho" relata.

A bancária foi demitida do banco após queixar-se das humilhações mas foi afastada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pedido do médico do trabalho durante o exame demissional.

"No banco se você recebe duas avaliações negativas é mandado embora. é uma pressão muito grande" destaca.
Paralelamente à cobrança por metas o setor bancário extinguiu 10 mil postos de trabalho em 2013 segundo estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

Profissionais vítimas de assédio moral podem desenvolver doenças físicas e psiquiátricas

Apesar do enxugamento no quadro de funcionários o lucro líquido dos bancos cresceu R$ 1 bilhão em relação a 2012 atingindo R$ 606 bilhões informa o Banco Central (BC).

No entanto em 2013 a relação entre rentabilidade e patrimônio (sigla ROE no jargão financeiro) dos bancos fechou com 1197% queda de 506 pontos percentuais em relação a 2012 segundo a consultoria Economatica. Este indicador avalia a rentabilidade das empresas.

"O setor bancário é o único que tem ferramenta de conflito de trabalho na convenção coletiva. Temos um canal onde o trabalhador pode denunciar casos de assédio moral. O banco ao receber a denúncia vai retreinar o gestor ou transferi-lo para evitar que esse problema volte a ocorrer" defende Magnus Apostólico diretor de Relações do Trabalho da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).

Segundo o diretor da entidade a federação recebeu 42 denúncias em 2011 — quando o canal foi lançado. Em 2012 119.

No ano passado esse número aumentou para 171 – alta de 4370% em relação a 2012.

"A alta expressiva se deve à entrada de um grande banco [no acordo] e ao maior acesso dos trabalhadores à ferramenta. Hoje eles se sentem mais confortáveis em reclamar" explica.

Na avaliação do diretor da Febraban as metas não são responsáveis pelo aumento do assédio moral. Isso porque segundo ele o índice de rotatividade do setor é baixo.

O que fazer ao setor vítima de assédio moral em ordem

1- Converse com o gestor com uma testemunha ao lado

2- Faça uma queixa no canal de denúncias do banco

3- Entre em contato com o sindicato da categoria

4- Denuncie o caso ao Ministério do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho

5- Entre com ação judicial contra o banco (Fonte: Ministério Público do Trabalho)

"O setor bancário é um segmento que roda pouco e mantém as pessoas no trabalho. Nossa rotatividade é de 45%"
defende o executivo da Febraban. Pesquisa do Dieese mostra que o índice de rotatividade no País em 2012 (último disponível) está em 64%.

Para Ricardo Carneiro procurador do Trabalho e gerente nacional do projeto "Assédio é Imoral" o profissional que sofre assédio moral geralmente teme perder o emprego ao realizar uma denúncia.

Por este motivo o MPT realizou uma campanha nacional em 2013 com foco no assédio moral dos bancários. O objetivo era que os trabalhadores se sensibilizassem e denunciassem casos de abuso a algum órgão como o próprio MPT.

"As pessoas estão conhecendo mais o que é assédio moral e consequentemente defendendo com mais força os seus direitos" destaca Carneiro.

Saúde

Casos de assédio moral não agridem apenas a integridade do funcionário mas também podem causar danos à saúde física e mental do profissional alerta Maria Maeno médica da Fundacentro do Ministério do Trabalho.

"As vítimas de humilhação podem ter desde mal estar e depressão até problemas gástricos hipertensão e anorexia. O tratamento deve ser feito com psiquiatra medicamentos e psicólogo e pode levar anos" aconselha a médica.

Olhar para o trabalho de forma negativa é o primeiro sinal de que algo não está certo afirma Maria. "A tendência de quem sofre assédio moral é ter repulsa ao trabalho. Não querer se imaginar mais dentro da empresa."

A bancária Lúcia* de 36 anos trabalha em um grande banco brasileiro há 15 anos. Nos últimos três começou a sentir dores de cabeça ter crises do pânico e ter pensamentos suicidas. O dianóstico é depressão.

"Fui afastada algumas vezes pelo INSS. Em uma delas quando voltei a trabalhar me colocaram para editar tabelas durante dois meses o que não é o meu trabalho. Disseram que estavam me fazendo um favor por eu estar empregada" relata a operadora de atendimento.

Indignada com a situação a bancária — que ainda está empregada — entrou com processo contra o banco em 2011 e ganhou em primeira instância. O caso contudo ainda corre na Justiça uma vez que a instituição financeira recorreu.

"Não pedi demissão porque meu marido não é registrado e tenho um filho de quatro anos. Preciso do plano de saúde e do dinheiro para comer. Fiquei traumatizada e não tenho mais condições de voltar ao mercado de trabalho por conta disso" diz.

*Os nomes das personagens foram omitidos a pedido das próprias entrevistadas

Fonte: UOL’

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