Mesmo com a provável redução de 0,25 ponto percentual na taxa Selic, amanhã, pelo Banco Central (BC), os consumidores devem continuar sofrendo com os elevados juros do setor financeiro. Desde o início dos cortes, que estão sendo feitos há 12 reuniões pelo Comitê de Política Monetária (Copom), os bancos diminuem o custo do crédito de forma lenta, aquém do esperado pela autarquia. Algumas instituições, por exemplo, continuam cobrando taxas astronômicas, que ultrapassam 1.000% ao ano.
O Correio separou seis linhas de crédito e verificou as cinco maiores taxas cobradas em cada modalidade. Há oferta, por exemplo, do rotativo do cartão crédito não regular — aquele em que o consumidor não paga o valor mínimo da fatura — com custo de 1.064% ao ano, ou 22,7% ao mês. Em outra modalidade, o custo para o crédito pessoal não consignado, chega a 978,85% anuais ou 21,92% mensais.
Isso mostra, segundo especialistas, que, mesmo se a Selic sair de 6,5% para 6,25% ao ano, ainda haverá cobrança “desproporcional” das taxas bancárias. Há vários fatores que explicam tal exagero. Um deles é o fato de os cinco principais bancos do país dominarem quase 80% do mercado de crédito, o que facilita cobrança maiores e “puxa” outras instituições para níveis também expressivos de custo. De acordo com Ione Amorim, economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), as taxas refletem, além de um provável cartel, a “indisposição” dos bancos de entender que a realidade brasileira não comporta mais os patamares atuais de juros.
Custos
“Nós vemos que, além da redução da Selic, o Banco Central adotou uma série de medidas, principalmente com foco no rotativo do cartão de crédito, em que, de fato, houve uma redução, mas ainda está extremamente elevado, com média de 334,8% anuais”, criticou Ione. “Outra medida foi a redução do depósito compulsório — valor recolhido mensalmente pelas instituições financeiras ao BC —, que diminui os custos para os bancos, permitindo, consequentemente, que eles diminuam os juros. Mesmo assim, não vemos uma mudança significativa nessa composição de taxas”, completou.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou, em nota, que os bancos têm, sim, aproveitado os cortes na Selic para reduzir o custo do crédito ao consumidor. “As taxas de juros médias cobradas em empréstimos para pessoas físicas com recursos livres (em que as empresas não são obrigadas a dar destinação específica para os recursos captados no mercado) caíram 17,1 pontos percentuais no período de outubro de 2016 a março de 2018. Nesse mesmo período, a Selic recuou 7,75 pontos percentuais. A taxa de juros média era de 74,3% ao ano, passando para 57,2% anuais”, argumentou a entidade.
Mesmo assim, é possível verificar que, em várias linhas de crédito, as taxas médias ficaram estáveis ou até subiram em menos de 12 meses, segundo informações divulgadas pelo Banco Central. Houve uma alta no rotativo regular do cartão de crédito — aquele em que o consumidor paga, ao menos, o valor mínimo da fatura. Em novembro de 2017, os juros dessa modalidade estavam em 218,3% ao ano, menores do que os 243,5% verificados em março deste ano. O cheque especial marcava 317,3% em agosto e passou para 324,7% anuais no mês passado. Já o crédito pessoal não consignado está no mesmo nivel de junho de 2017: 125% ao ano.
O logístico Arsênio Buckar Rocha, 33 anos, descobriu da pior forma que as taxas são elevadas no Brasil. O banco aumentou automaticamente o limite do cartão de crédito depois que ele virou funcionário público. Ele não percebeu, mas decidiu comprar um aparelho celular de R$ 600 de forma parcelada. “Acabei arcando com cerca de R$ 6 mil, porque tive dificuldade de pagar as prestações e fiquei devendo”, afirmou. “Os juros aumentavam cada vez mais o preço do aparelho. O banco só baixou a taxa depois que eu negociei uma quantia para quitar o valor total”, completou.
A Febraban ressaltou, em comunicado, que o custo associado a inadimplência, tributação, depósitos compulsórios e outros elementos do sistema de regulação são bem mais altos no Brasil do que em outros países emergentes, como Chile e Turquia, o que provoca esses juros mais caros. Mesmo assim, o spread bancário — a diferença entre o custo de captação e o que é efetivamente cobrado do cliente final — ainda está longe de ter um desempenho benéfico ao consumidor. Em março, o índice estava em 27 pontos percentuais, maior do que o registrado há dois meses, de 25,9 pontos.
consumidor “leva um tempo” para ser sentido. “Geralmente, quatro a seis meses. Há redução nos bancos, mas não na magnitude que esperamos”, disse. “As taxas têm uma série de componentes, além da Selic. É importante que haja o repasse, mas é preciso observar os outros custos.”
Fonte: Correio Braziliense